quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Esquimós


Os esquimós (ou inuit como se autodenominam) vivem no Ártico, uma das regiões mais frias da Terra. As teorias mais propagadas afirmam que seu assentamento nas regiões mais frias do planeta se deve ao rechaço de que foram objeto por parte dos índios americanos (há 12.000 anos), quando chegaram ao Alaska, vindos do nordeste da Ásia e através do estreito de Bering.

Hoje, os esquimós não formam nem pertencem a alguma nação. Trata-se de um povo solidário, acolhedor e muito pacífico. São nômades por natureza. Sua civilização se baseia na família, patriarcal e poligâmica, na qual o homem tem mais mulheres na medida em que possui mais riquezas.

As crianças são muito importantes para os esquimós porque, de acordo com suas crenças, os pequenos são reencarnações de seus antepassados. Os inuit crêem na existência de seres superiores aos quais não é necessário cultuar ou mesmo fazer orações.
A estatura dos esquimós é pequena, os homens medem, em média, 1,60 m e as mulheres 10 cm menos. Seus corpos são fortes e seus membros curtos.
As terras do norte, extremamente frias, não permitem o crescimento de plantas, as únicas coisas que os esquimós podem fazer para sobreviver é caçar e pescar. É muito característico dos esquimós andar acompanhados de cães, usados para caçar e puxar os trenós, seu principal meio de transporte.
Dentro de suas casas, as mulheres se dedicam a cozinhar e costurar, enquanto os homens preparam seus utensílios para caçar e pescar focas e baleias. Os esquimós aproveitam tudo dos animais caçados: carne, gordura, pele, ossos e intestinos. Sua dieta habitual era a carne fervida, mas devido à lentidão deste processo e a escassez do combustível animal que era necessário, este povo passou a come carne crua. A origem da palavra esquimó (no idioma algonquino) quer dizer comedor de carne crua.
As roupas dos esquimós são feitas com pele de foca, com a pelagem voltada para dentro e forradas com pele de urso ou de raposas, que as mulheres mascam com seus dentes e curtem com urina. Estas roupas são costuradas com os tendões dos animais.
Durante o inverno é comum que os alimentos fiquem escassos, época em que os homens saem para viajar e caçar. Quando as expedições duram muitos dias, é necessário construir casas temporárias, feitos com gelo, os iglus são estes famosos refúgios.
A língua esquimó está dividida em quatro dialetos bem parecidos, que só tem Substantivos e verbos.

Fonte:Thais Pacievitch
Infoescola

Història da Azaléia

A empresa de calçados Azaléia foi fundada em 2 de dezembro de 1958, na idéia inicial dos empresários Arnaldo Luiz de Paula, Nelson Lauck e Arnildo Lauck. O primeiro nome da empresa foi “Berlitz, Lac e Cia. Ltda”.

A primeira instalação da empresa que começou a produzir dez pares de calçados femininos por dia, foi um barracão de madeira alugado onde trabalhavam os sócios e as esposas. A empresa cresceu e hoje está sediada em Parobé, cidade do Rio Grande do Sul.

Possui filiais de produção nos estados do Rio Grande do Sul, Bahia e Sergipe. Representação comercial em todo Brasil, EUA, Europa e América Latina.

Exporta para mais e 80 países através de 3 mil pontos-de-venda em todo os continentes, sendo 15 mil pontos-de-venda no Brasil. Além da marca Azaléia, é proprietária das marcas AZ, Dijean, Funny e Olympikus. Atende a vários públicos específicos como mulheres jovens e maduras; estilo social e esportivo; formal e simples.

Apresenta em sua filosofia junto a sociedade um projeto de Responsabilidade Social, atendendo na fabricação de mais de 160.000 pares/dia ao respeito pelo meio ambiente reciclando insumos, tratando efluentes líquidos e emissões atmosféricas. É parceira no projeto Criança Esperança, realiza fóruns de temas sociais e campanhas pontuais como a campanha do agasalho.


Fonte:Fernando Rebouças.
Infoescola

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

A aliança

Luis Fernando Verissimo


Esta é uma história exemplar, só não está muito claro qual é o exemplo. De qualquer jeito, mantenha-a longe das crianças. Também não tem nada a ver com a crise brasileira, o apartheid, a situação na América Central ou no Oriente Médio ou a grande aventura do homem sobre a Terra. Situa-se no terreno mais baixo das pequenas aflições da classe média. Enfim. Aconteceu com um amigo meu. Fictício, claro.

Ele estava voltando para casa como fazia, com fidelidade rotineira, todos os dias à mesma hora. Um homem dos seus 40 anos, naquela idade em que já sabe que nunca será o dono de um cassino em Samarkand, com diamantes nos dentes, mas ainda pode esperar algumas surpresas da vida, como ganhar na loto ou furar-lhe um pneu. Furou-lhe um pneu. Com dificuldade ele encostou o carro no meio-fio e preparou-se para a batalha contra o macaco, não um dos grandes macacos que o desafiavam no jângal dos seus sonhos de infância, mas o macaco do seu carro tamanho médio, que provavelmente não funcionaria, resignação e reticências... Conseguiu fazer o macaco funcionar, ergueu o carro, trocou o pneu e já estava fechando o porta-malas quando a sua aliança escorregou pelo dedo sujo de óleo e caiu no chão. Ele deu um passo para pegar a aliança do asfalto, mas sem querer a chutou. A aliança bateu na roda de um carro que passava e voou para um bueiro. Onde desapareceu diante dos seus olhos, nos quais ele custou a acreditar. Limpou as mãos o melhor que pôde, entrou no carro e seguiu para casa. Começou a pensar no que diria para a mulher. Imaginou a cena. Ele entrando em casa e respondendo às perguntas da mulher antes de ela fazê-las.

— Você não sabe o que me aconteceu!

— O quê?

— Uma coisa incrível.

— O quê?

— Contando ninguém acredita.

— Conta!

— Você não nota nada de diferente em mim? Não está faltando nada?

— Não.

— Olhe.

E ele mostraria o dedo da aliança, sem a aliança.

— O que aconteceu?

E ele contaria. Tudo, exatamente como acontecera. O macaco. O óleo. A aliança no asfalto. O chute involuntário. E a aliança voando para o bueiro e desaparecendo.

— Que coisa - diria a mulher, calmamente.

— Não é difícil de acreditar?

— Não. É perfeitamente possível.

— Pois é. Eu...

— SEU CRETINO!

— Meu bem...

— Está me achando com cara de boba? De palhaça? Eu sei o que aconteceu com essa aliança. Você tirou do dedo para namorar. É ou não é? Para fazer um programa. Chega em casa a esta hora e ainda tem a cara-de-pau de inventar uma história em que só um imbecil acreditaria.

— Mas, meu bem...

— Eu sei onde está essa aliança. Perdida no tapete felpudo de algum motel. Dentro do ralo de alguma banheira redonda. Seu sem-vergonha!

E ela sairia de casa, com as crianças, sem querer ouvir explicações. Ele chegou em casa sem dizer nada. Por que o atraso? Muito trânsito. Por que essa cara? Nada, nada. E, finalmente:

— Que fim levou a sua aliança? E ele disse:

— Tirei para namorar. Para fazer um programa. E perdi no motel. Pronto. Não tenho desculpas. Se você quiser encerrar nosso casamento agora, eu compreenderei.

Ela fez cara de choro. Depois correu para o quarto e bateu com a porta. Dez minutos depois reapareceu. Disse que aquilo significava uma crise no casamento deles, mas que eles, com bom-senso, a venceriam.

— O mais importante é que você não mentiu pra mim.

E foi tratar do jantar.


Texto extraído do livro "As mentiras que os homens contam", Editora Objetiva - Rio de Janeiro, 2000, pág. 37.

Primavera

Cecília Meireles


A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.

Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.

Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.

Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.

Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.

Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.

Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.

Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.

Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera.


Texto extraído do livro "Cecília Meireles - Obra em Prosa - Volume 1", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1998, pág. 366.

sábado, 26 de setembro de 2009

Personagem

Bernardo é um gáucho que mora ha dois anos em Minas Gerais. Começou a faculdade de letras na UFRGS , e terminou na UFJF, pois quando estava no quinto período, a empresa onde trabalhava, o transferiu para uma filial em Juíz de Fora. Recentemente ele passou em concurso público, e agora leciona literatura em uma cidade do interior de Minas, com menos de 10 mil habitantes. Todo sábado ele precisa se deslocar para Juíz de Fora , pois está fazendo um curso de especialização em estudos literários.

Bernardo tem 22 anos, 1,82 de altura. Olhos grandes, verde- folha com algumas nuances de azul turquesa. Usa um cavanhaque que o deixa extremamente charmoso -mas ele não sabe disso- usa esse artifício apenas por acreditar que assim ele fica com cara de sério. É um cara romantico. Adora poesias, música clássica e teatro. Nas horas vagas gosta de tocar violão, ler ou escrever. Também gosta muito de história da arte e filosofia. Tem planos de publicar um livro de poemas que escreveu. Uma editora está analisando a obra e ele aguarda ansiosamente a resposta.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Vou postar aqui um poema .
Talvez vocês o achem infantil, exagerado ou demasiadamente sentimental. Mas peço que considerem que eu o fiz ha muito tempo, numa época em que eu ainda acreditava em príncipes encantados e finais felizes. Lendo-o agora encontrei coisas que precisavam ser corrigidas. Mas se eu mudasse alguma coisa, acabaria alterando o que ele representa pra mim.

MEU TRÁGICO AMOR DE PRIMAVERA

Antes tudo era monotonia.
Isuportável rotina da melancolia.
Diversificar eu tentava, mas era em vão.
Achar o que preenchia o espaço vago em meu coração.

E num túnel que escuro estava,
Vi de longe a luz que procurava.

Dissipando a escuridão ao meu redor,
Daria minha vida, meu sangue, meu suor.

Mas a luz que era minha única esperança,
foi embora e ficou só na lembrança.
Eu ansiosa, esperando ele voltar,
perceber que não era inútil amar.

E o meu olhar distante,
vida amarga como o féu.
Lembrar daquele diamante
que tem os olhos da cor do céu.

Em sonhos frequente emoção,
não passava de uma ilusão,
meu coração acreditava de verdade,
que pudesse se tornar realidade.

E o que antes estava além do infinito,
esteve bem perto de mim agora.
Eu vivi o meu sonho mais bonito;
A volta de um amor que foi embora.

Pensei que sonhando ainda estava eu,
mas não estava dormindo, era muito real.
Que um dia ele pudesse ser meu,
era uma coisa sensacional.

De fato estava sonhando,acordada.
Caí da cama e me machuquei.
Estava triste, decepcionada,
sofri,com tudo isso chorei.

O que vivi de fato um sonho era,
mas realizei por um momento.
Foi a a mais linda primavera,
e ainda guardo em meu pensamento.
"Só se vê com o coração.

O essencial é invisivel aos olhos."

Exupére

Lágrimas ocultas

Adélia Prado :

"Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era querida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...

E a minha triste boca dolorida,
que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!

E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim...

E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!"



Extraído de:http://www.luso-poemas.net/modules/news03/index.php?storytopic=47

Pelicano

Adélia Prado


Um dia vi um navio de perto.
Por muito tempo olhei-o
com a mesma gula sem pressa com que olho
Jonathan:
primeiro as unhas, os dedos, seus nós.
Eu amava o navio.
Oh! eu dizia. Ah, que coisa é um navio!
Ele balançava de leve
como os sedutores meneiam.
À volta de mim busquei pessoas:
olha, olha o navio
e dispus-me a falar do que não sabia
para que enfim tocasse
no onde o que não tem pés
caminha sobre a massa das águas.
Uma noite dessas, antes de me deitar
vi - como vi o navio - um sentimento.
Travada de interjeições, mutismos,
vocativos supremos balbuciei:
Ó Tu! e Ó Vós!
- a garganta doendo por chorar.
Me ocorreu que na escuridão da noite
eu estava poetizada,
um desejo supremo me queria
Ó Misericórdia, eu disse
e pus minha boca no jorro daquele peito.
Ó amor, e me deixei afagar,
a visão esmaecendo-se,
lúcida, ilógica,
verdadeira como um navio.

(Poesia Reunida, p.359)

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Conto: A menina dos olhos

Nilto Maciel


Corríamos pelo campo, não sei bem com que intenções. Possivelmente desejávamos pegar borboletas ou grilos. Talvez quiséssemos apenas correr. Não consigo lembrar-me dessas migalhas. Já faz muito tempo. Eu devia ser um pedacinho de gente de uns cinco ou seis anos.
Havia uma cerca de arame a dividir o terreno em dois mundos opostos: de um lado capim rasteiro; de outro, terra nua. E tratamos de transpô-la. E já então arrastava-nos a determinação de achar não sei o quê. Uns pareciam mais decididos, como se comandassem os demais. Raquel sobretudo, que caminhava à frente e de vez em quando parava, abaixa?va-se, cutucava o chão. Uns acercavam-se dela, faziam-lhe per?guntas, arranjavam gravetos e espetavam a terra. Imitavam-na ou queriam agradá-la. Outros, como eu, permaneciam ao largo, mais curiosos que agitados, à espera de novas invenções de Raquel.
Aqui e ali a terra se apresentava fofa, como se a tivessem revolvido profundamente. E eu sentia medo, a imaginar cadá?veres enterrados, tesouros encobertos, buracos que fossem dar no país dos anões. Raquel, porém, parecia saber de tudo, co?nhecer palmo a palmo o terreno e nem sequer se espantava quan?do metia o pé num buraco mais fundo.
Pouco a pouco, só eu permaneci mais afastado e até vol?tei à cerca. O ciúme não me deixava ir atrás de Raquel, feito um qualquer. Por que não me havia falado nada? Por que não me dava atenção? Por que preferia a companhia dos outros?
Ela falava sem parar e todos a escutavam. Apontava para o chão, como se explicasse coisas muito interessantes, a origem dos buracos, o nome dos mortos, o valor dos tesouros, a vida dos anões. Eu não conseguia ouvir sua voz, e mais me emburrava.
Para onde fosse Raquel, iam os outros, como se ela os tivesse atados por cordões. Arrastava-os de lá para cá, de cá para lá. E eu sem saber o que tanto buscavam. A casa do preá, o ovo da galinha, a cova da avozinha?
Primeiro Raquel apalpava o chão com um pé, o corpo sus?tentado no outro, para só então seus súditos criarem cora?gem de avançar, como se a terra pudesse abrir-se para os engolir.
A cada passo de Raquel meu coração dava um pulo e eu fechava os olhos para não vê-la desaparecer. Abria-os, o coração de novo a pular, e já ela aparecia noutro lugar, um passo aqui, pum-pum, um passo acolá, pum-pum.
Súbito Raquel afundava e gritava, estarrecida, chorava e agitava as mãos, perdida. E os outros corriam, chocavam-se, tombavam, e eu ainda agarrei-me à cerca, a ferir-me as mãos, paralisado, frio.
E muitos anos depois, toda vez que eu via Raquel, eu a imaginava morta, a passear na sua transparência através das paredes, dos objetos, de mim mesmo, e vir alojar-se bem dentro de meus olhos.


fonte: Literatura sem fronteiras – niltomaciel@uol.com.br

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Sobre Adélia Prado:

Começei a me interessar por essa autora,quando ouvi um padre que admiro muito falar empolgado sobre suas obras fascinantes. Percebi que precisava conhece-la, afinal, vindo dele só poderia ser coisa muito boa. E eu não estava errada.Tenho pesquisado e confesso me surpreender a cada nova coisa que descubro a respeito da competencia dessa mineira tão determinada e autêntica.Por isso decidi postar aqui um pouco de sua história. É um pouco grande, mas vale a pena ler:

Adélia Luzia Prado Freitas nasceu em Divinópolis, Minas Gerais, no dia 13 de dezembro de 1935, filha do ferroviário João do Prado Filho e de Ana Clotilde Corrêa. Leva uma vidinha pacata naquela cidade do interior: inicia seus estudos no Grupo Escolar Padre Matias Lobato e mora na rua Ceará.

No ano de 1950 falece sua mãe. Tal acontecimento faz com que a autora escreva seus primeiros versos. Nessa época conclui o curso ginasial no Ginásio Nossa Senhora do Sagrado Coração, naquela cidade.

No ano seguinte inicia o curso de Magistério na Escola Normal Mário Casassanta, que conclui em 1953. Começa a lecionar no Ginásio Estadual Luiz de Mello Viana Sobrinho em 1955.

Em 1958 casa-se, em Divinópolis, com José Assunção de Freitas, funcionário do Banco do Brasil S.A. Dessa união nasceriam cinco filhos: Eugênio (em 1959), Rubem (1961), Sarah (1962), Jordano (1963) e Ana Beatriz (1966).

Antes do nascimento da última filha, a escritora e o marido iniciam o curso de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis.

Em 1972 morre seu pai e, em 1973, forma-se em Filosofia. Nessa ocasião envia carta e originais de seus novos poemas ao poeta e crítico literário Affonso Romano de Sant'Anna, que os submete à apreciação de Carlos Drummond de Andrade.

"Moça feita, li Drummond a primeira vez em prosa. Muitos anos mais tarde, Guimarães Rosa, Clarisse. Esta é a minha turma, pensei. Gostam do que eu gosto. Minha felicidade foi imensa.Continuava a escrever, mas enfadara-me do meu próprio tom, haurido de fontes que não a minha. Até que um dia, propriamente após a morte do meu pai, começo a escrever torrencialmente e percebo uma fala minha, diversa da dos autores que amava. É isto, é a minha fala."

Em 1975, Drummond sugere a Pedro Paulo de Sena Madureira, da Editora Imago, que publique o livro de Adélia, cujos poemas lhe pareciam "fenomenais". O poeta envia os originais ao editor daquele que viria a ser Bagagem. No dia 09 de outubro, Drummond publica uma crônica no Jornal do Brasil chamando a atenção para o trabalho ainda inédito da escritora.

"Bagagem, meu primeiro livro, foi feito num entusiasmo de fundação e descoberta nesta felicidade. Emoções para mim inseparáveis da criação, ainda que nascidas, muitas vezes, do sofrimento. Descobri ainda que a experiência poética é sempre religiosa, quer nasça do impacto da leitura de um texto sagrado, de um olhar amoroso sobre você, ou de observar formigas trabalhando."

O livro é lançado no Rio, em 1976, com a presença de Antônio Houaiss, Raquel Jardim, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Juscelino Kubitscheck, Affonso Romano de Sant'Anna, Nélida Piñon e Alphonsus de Guimaraens Filho, entre outros.

O ano de 1978 marca o lançamento de O coração disparado que é agraciado com o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro.

Estréia em prosa no ano seguinte, com Soltem os cachorros. Com o sucesso de sua carreira de escritora vê-se obrigada a abandonar o magistério, após 24 anos de trabalho. Nesse período ensinou no Instituto Nossa Senhora do Sagrado Coração, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis, Fundação Geraldo Corrêa — Hospital São João de Deus, Escola Estadual são Vicente e Escola Estadual Matias Cyprien, lecionando Educação Religiosa, Moral e Cívica, Filosofia da Educação, Relações Humanas e Introdução à Filosofia. Sua peça, O Clarão,um auto de natal escrito em parceria com Lázaro Barreto, é encenada em Divinópolis.

"O transe poético é o experimento de uma realidade anterior a você. Ela te observa e te ama. Isto é sagrado. É de Deus. É seu próprio olhar pondo nas coisas uma claridade inefável. Tentar dizê-la é o labor do poeta."

Em 1980, dirige o grupo teatral amador Cara e Coragem na montagem de O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. No ano seguinte, ainda sob sua direção, o grupo encenaria A Invasão, de Dias Gomes. Publica Cacos para um vitral. Lucy Ann Carter apresenta, no Departament of Comparative Literature, da Princeton University, o primeiro de uma série de estudos universitários sobre a obra de Adélia Prado.

Em 1981 lança Terra de Santa Cruz.

De 1983 a 1988 exerce as funções de Chefe da Divisão Cultural da Secretaria Municipal de Educação e da Cultura de Divinópolis, a convite do prefeito Aristides Salgado dos Santos.

Os componentes da banda é publicado em 1984.

Participa, em 1985, em Portugal, de um programa de intercâmbio cultural entre autores brasileiros e portugueses, e em Havana, Cuba, do II Encontro de Intelectuais pela Soberania dos Povos de Nossa América.

Fernanda Montenegro estréia, no Teatro Delfim - Rio de Janeiro, em 1987, o espetáculo Dona Doida: um interlúdio, baseado em textos de livros da autora. A montagem, sob a direção de Naum Alves de Souza, fez grande sucesso, tendo sido apresentada em diversos estados brasileiros e, também, nos EUA, Itália e Portugal.

Apresenta-se, em 1988, em Nova York, na Semana Brasileira de Poesia, evento promovido pelo Comitê Internacional pela Poesia. É publicado A faca no peito.

Participa, em Berlim, Alemanha, do Línea Colorada, um encontro entre escritores latino-americanos e alemães.

Em 1991 é publicada sua Poesia Reunida.

Volta, em 1993, à Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Divinópolis, integrando a equipe de orientação pedagógica na gestão da secretária Teresinha Costa Rabelo.

Em 1994, após anos de silêncio poético, sem nenhuma palavra, nenhum verso, ressurge Adélia Prado com o livro O homem da mão seca. Conta a autora que o livro foi iniciado em 1987, mas, depois de concluir o primeiro capítulo, foi acometida de uma crise de depressão, que a bloquearia literariamente por longo tempo. Disse que vê "a aridez como uma experiência necessária" e que "essa temporada no deserto" lhe fez bem. Nesse período, segundo afirmou, foi levada a procurar ajuda de um psiquiatra.

"O que se passou? Uma desolação, você quer, mas não pode. Contudo, a poesia é maior que a poeta, e quando ela vem, se você não a recebe, este segundo inferno é maior que o primeiro, o da aridez."

Deus é personagem principal em sua obra. Ele está em tudo. Não apenas Ele, mas a fé católica, a reza, a lida cristã.

"Tenho confissão de fé católica. Minha experiência de fé carrega e inclui esta marca. Qual a importância da religião? Dá sentido à minha vida, costura minha experiência, me dá horizonte. Acredito que personagens são álter egos, está neles a digital do autor. Mas, enquanto literatura, devem ser todos melhores que o criador para que o livro se justifique a ponto de ser lido pelo seu autor como um livro de outro. Autobiografias das boas são excelentes ficções."

Estréia, em 1996, no Teatro Sesi Minas, em Belo Horizonte, a peça Duas horas da tarde no Brasil, texto adaptado da obra da autora por Kalluh Araújo e pela filha de Adélia, Ana Beatriz Prado.

São lançados Manuscritos de Felipa e Oráculos de maio. Participa, em maio, da série "O escritor por ele mesmo", no ISM-São Paulo. Em Belo Horizonte é apresentado, sob a direção de Rui Moreira, O sempre amor, espetáculo de dança de Teresa Ricco baseado em poemas da escritora.

Adélia costuma dizer que o cotidiano é a própria condição da literatura. Morando na pequena Divinópolis, cidade com aproximadamente 200.000 habitantes, estão em sua prosa e em sua poesia temas recorrentes da vida de província, a moça que arruma a cozinha, a missa, um certo cheiro do mato, vizinhos, a gente de lá.

"Alguns personagens de poemas são vazados de pessoas da minha cidade, mas espero estejam transvazados no poema, nimbados de realidade. É pretensioso? Mas a poesia não é a revelação do real? Eu só tenho o cotidiano e meu sentimento dele. Não sei de alguém que tenha mais. O cotidiano em Divinópolis é igual ao de Hong-Kong, só que vivido em português."

Em 2000, estréia o monólogo Dona da casa, em São Paulo, adaptação de José Rubens Siqueira para Manuscritos de Felipa. A direção é de Georgette Fadel e Élida Marques interpreta Felipa.

Em 2001, apresenta no Sesi Rio de Janeiro e em outras cidades, sarau onde declama poesias de seu livro Oráculos de Maio acompanhada por um quarteto de cordas.


OBRAS:

Individuais

POESIA

- Bagagem, Imago - 1976

- O coração disparado, Nova Fronteira - 1978

- Terra de Santa Cruz, Nova Fronteira - 1981

- O pelicano, Rio de Janeiro - 1987

- A faca no peito, Rocco - 1988

- Oráculos de maio, Siciliano - 1999

PROSA

- Solte os cachorros, Nova Fronteira - 1979

- Cacos para um vitral, Nova Fronteira - 1980

- Os componentes da banda, Nova Fronteira - 1984

- O homem da mão seca, Siciliano - 1994

- Manuscritos de Felipa, Siciliano - 1999

- Filandras, Record - 2001

ANTOLOGIA

Mulheres & Mulheres, Nova Fronteira - 1978

Palavra de Mulher, Fontana - 1979

Contos Mineiros, Ática - 1984

Poesia Reunida, Siciliano - 1991 (Bagagem, O Coração Disparado, Terra de Santa Cruz, O pelicano e A faca no peito).

Antologia da poesia brasileira, Embaixada do Brasil em Pequim - 1994.

Prosa Reunida, Siciliano - 1999

BALÉ

- A Imagem Refletida - Balé do Teatro Castro Alves - Salvador - Bahia - Direção Artística de Antônio Carlos Cardoso. Poema escrito especialmente para a composição homônima de Gil Jardim.

Vem de antes do sol
A luz que em tua pupila me desenha.
Aceito amar-me assim
Refletida no olhar com que me vês.

Ó ventura beijar-te,
espelho que premido não estilhaça
e mais brilha porque chora
e choro de amor radia.

(Divinópolis, 1998).

Em parceria

A lapinha de Jesus (com Lázaro Barreto) - Vozes - 1969

Caminhos de solidariedade (com Lya Luft, Marcos Mendonça, et al.) - Gente- 2001.

Traduções

Para o inglês

- Adélia Prado: thirteen poems. Tradução de Ellen Watson. Suplemento do The American Poetry Review, jan/fev 1984.

- The headlong heart (Poesias de Terra de Santa Cruz, O coração disparado e Bagagem). Tradução de Ellen Watson, New York, 1988, Livingston University Press.

- The alphabet in the park (O alfabeto no parque). Tradução de Ellen Watson, Middletown, Wesleyan University Press, 1990.

Para o espanhol:

- El corazón disparado (O coração disparado). Tradução de Cláudia Schwartez e Fernando Roy, Buenos Aires, Leviantan, 1994.

- Bagagem. Tradução de José Francisco Navarro Huamán. México, Universidade Ibero-Americana, a sair.

Participação em antologias

- Assis Brasil (org.). A poesia mineira no século XX. Imago, 1998.

- Hortas, Maria de Lurdes (org.). Palavra de mulher, Fontoura, 1989.

- "Sem enfeite nenhum". In Prado Adélia et alii. Contos mineiros. Ática, 1984.


O trabalho acima foi baseado em dados obtidos na Internet (Jornal da Poesia, depoimento à Biblioteca Nacional, "As conversas com Deus" -- Luciana Hidalgo - O Globo), BTCA - A.C.Cardoso, Cadernos de Literatura Brasileira - Instituto Moreira Salles, entre outros, e em livros da autora.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Simplifique sua vida!




Tudo o que é belo tende a ser simples. Afirmação generalizante? Não sei. O que sei é que a beleza anda de braços dados com a simplicidade. Basta observar a lógica silenciosa que prevalece nos jardins. Vida que se ocupa de ser só o que é.

Não há conflito nas bromélias, não há angústia nas rosas, nem ansiedades nos jasmins. Cumprem o destino de florirem ao seu tempo e de se despedirem do viço quando é chegada a hora. São simples.

Não querem outra coisa, senão a necessidade de cada instante. Não há desperdício de forças, não há dispersão de energias. Tudo concorre para a realização do instante. Acolhem a chuva que chega e dela extraem o essencial. Recebem o sol e o vento, e morrem ao seu tempo.

Simplicidade é um conceito que nos remete ao estado mais puro da realidade. A semente é simples porque não se perde na tentativa de ser outra coisa. É o que é. Não desperdiça seu tempo querendo ser flor antes da hora. Cumpre o ritual de existir, compreendendo-se em cada etapa.

Já dizia o poeta: "Simplicidade é querer uma coisa só". Eu concordo com ele. O muito querer nos deixa complexos demais. Queremos muito ao mesmo tempo, e então nos perdemos no emaranhado dos desejos. Há o risco de que não fiquemos com nada, de que percamos tudo.

Aquele que muito quer corre o risco de nada ter, porque o empenho e o cuidado é que faz a realidade permanecer. O simples anda leve. Carrega menos bagagem quando viaja, e por isso reserva suas energias para apreciar a paisagem. O que viaja pesado corre o risco de gastar suas energias no transporte das malas. Fica preso, não pode andar pelo aeroporto, fica privado de atravessar a rua e se transforma num constante vigilante do que trouxe.

A simplicidade é uma forma de leveza. Nas relações humanas ela faz a diferença. O que cultiva a simplicidade tem a facilidade de tornar leve o ambiente em que vive. Não cria confusão por pouca coisa; não coloca sua atenção no que é acidental, mas prende os olhos naquilo que verdadeiramente vale à pena.

Pessoas simples são aquelas que se encantam com as coisas menores. Sabem sorrir diante de presentes simbólicos e sem muito valor material. A simplicidade lhe capacita para perceber que nem tudo precisa ter utilidade. E por isso é fácil presentear o simples.

Dar presentes aos complicados é um desafio. Não sabemos o que eles gostam, porque só na simplicidade é possível conhecer alguém. Só depois que as máscaras caem pelo chão e que os papéis são abandonados a gente tem a possibilidade de descobrir o outro na sua verdade.

Eu gostaria de me livrar de meus pesos. Queria ser mais leve, mais simples. Querer uma coisa só de cada vez. Abandonar os inúmeros projetos futuros que me cegam para a necessidade do momento. Projetos futuros valem à pena, desde que sejam simples, concretos e aplicáveis. Não gostaria que a morte me surpreendesse sem que eu tivesse alcançado a simplicidade. Até para morrer os simples têm mais facilidade. Sentem que chegou a hora, se entregam ao último suspiro e se vão.

Tenho uma intuição de que quando eu simplificar a minha vida, a felicidade chegará em minha casa, quando eu menos esperar.


( Padre Fábio de Melo )

Os girassóis e nós



Eles são submissos. Mas não há sofrimento nesta submissão. A sabedoria vegetal os conduz a uma forma de seguimento surpreendente. Fidelidade incondicional que os determina no mundo, mas sem escravizá-los.

A lógica é simples. Não há conflito naquele que está no lugar certo, fazendo o que deveria. É regra da vida que não passa pela força do argumento, nem tampouco no aprendizado dos livros. É força natural que conduz o caule, ordenando e determinando que a rosa realize o giro, toda vez que mudar a direção do Regente.

Estão mergulhados numa forma de saber milenar, regra que a criação fez questão de deixar na memória da espécie. Eles não podem sobreviver sem a força que os ilumina. Por isso, estão entregues aos intermitentes e místicos movimentos de procura. Eles giram e querem o sol. Eles são girassóis.

Deles me aproximo. Penso no meu destino de ser humano. Penso no quanto eu também sou necessitado de voltar-me para uma força regente, absoluta, determinante. Preciso de Deus. Se para Ele não me volto corro o risco de me desprender de minha possibilidade de ser feliz. É Nele que meu sentido está todo contido. Ele resguarda o infinito de tudo o que ainda posso ser. Descubro maravilhado. Mas no finito que me envolve posso descobrir o desafio de antecipar no tempo, o que Nele já está realizado.

Então intuo. Deus me dá aos poucos, em partes, dia a dia, em fragmentos.

Eu Dele me recebo, assim como o girassol se recebe do sol, porque não pode sobreviver sem sua luz. A flor condensa, ainda que de forma limitada, porque é criatura, o todo de sua natureza que o sol potencializa.

O mesmo é comigo. O mesmo é com você. Deus é nosso sol, e nós não poderíamos chegar a ser quem somos, em essência, se Nele não colocarmos a direção dos nossos olhos.

Cada vez que o nosso olhar se desvia de sua regência, incorremos no risco de fazer ser o nosso sol, o que na verdade não passa de luz artificial.

Substituição desastrosa que chamamos de idolatria. Uma força humana colocada no lugar de Deus.

A vida é o lugar da Revelação divina. É na força da história que descobrimos os rastros do Sagrado. Não há nenhum problema em descobrir nas realidades humanas algumas escadarias que possam nos ajudar a chegar ao céu. Mas não podemos pensar que a escadaria é o lugar definitivo de nossa busca. Parar os nossos olhos no humano que nos fala sobre Deus é o mesmo que distribuir fragmentos de pólvora pelos cômodos de nossa morada. Um risco que não podemos correr.

Tudo o que é humano é frágil, temporário, limitado. Não é ele que pode nos salvar. Ele é apenas um condutor. É depois dele que podemos encontrar o que verdadeiramente importa. Ele, o fundamento de tudo o que nos faz ser o que somos. Ele, o Criador de toda realidade. Deus trino, onipotente, fonte de toda luz.

Sejamos como os girassóis...

Uma coisa é certa. Nós estamos todos num mesmo campo. Há em cada um de nós uma essência que nos orienta para o verdadeiro lugar que precisamos chegar, mas nem sempre realizamos o movimento da procura pela luz.

Sejamos afeitos a este movimento místico, natural. Não prenda os seus olhos no oposto de sua felicidade. Não queira o engano dos artifícios que insistem em distrair a nossa percepção. Não podemos substituir o essencial pelo acidental. É a nossa realização que está em jogo.

Girassol só pode ser feliz se para o Sol estiver orientado. É por isso que eles não perdem tempo com as sombras.

Eles já sabem, mas nós precisamos aprender.

Pe. Fábio de Melo

Conto: Sem Enfeite Nenhum

Adélia Prado

A mãe era desse jeito: só ia em missa das cinco, por causa de os gatos no escuro serem pardos. Cinema, só uma vez, quando passou os Milagres do padre Antônio em Urucânia. Desde aí, falava sempre, excitada nos olhos, apressada no cacoete dela de enrolar um cacho de cabelo: se eu fosse lá, quem sabe?
Sofria palpitação e tonteira, lembro dela caindo na beira do tanque, o vulto dobrado em arco, gente afobada em volta, cheiro de alcanfor.
Quando comecei a empinar as blusas com o estufadinho dos peitos, o pai chegou pra almoçar, estudando terreno, e anunciou com a voz que fazia nessas ocasiões, meio saliente: companheiro meu tá vendendo um relogim que é uma gracinha, pulseirinha de crom', danado de bom pra do Carmo. Ela foi logo emendando: tristeza, relógio de pulso e vestido de bolér. Nem bolero ela falou direito de tanta antipatia. Foi água na fervura minha e do pai.Vivia repetindo que era graça de Deus se a gente fosse tudo pra um convento e várias vezes por dia era isto: meu Jesus, misericórdia... A senhora tá triste, mãe? eu falava. Não, tou só pedindo a Deus pra ter dó de nós.
Tinha muito medo da morte repentina e pra se livrar dela, fazia as nove primeiras sextas-feiras, emendadas. De defunto não tinha medo, só de gente viva, conforme dizia. Agora, da perdição eterna, tinha horror, pra ela e pros outros.
Quando a Ricardina começou a morrer, no Beco atrás da nossa casa, ela me chamou com a voz alterada: vai lá, a Ricardina tá morrendo, coitada, que Deus perdoe ela, corre lá, quem sabe ainda dá tempo de chamar o padre, falava de arranco, querendo chorar, apavorada: que Deus perdoe ela, ficou falando sem coragem de aluir do lugar.
Mas a Ricardina era de impressionar mesmo, imagina que falou pra mãe, uma vez, que não podia ver nem cueca de homem que ela ficava doida. Foi mais por isso que ela ficou daquele jeito, rezando pra salvação da alma da Ricardina.
Era a mulher mais difícil a mãe. Difícil, assim, de ser agradada. Gostava que eu tirasse só dez e primeiro lugar. Pra essas coisas não poupava, era pasta de primeira, caixa com doze lápis e uniforme mandado plissar. Acho mesmo que meia razão ela teve no caso do relógio, luxo bobo, pra quem só tinha um vestido de sair.
Rodeava a gente estudar e um dia falou abrupto, por causa do esforço de vencer a vergonha: me dá seus lápis de cor. Foi falando e colorindo laranjado, uma rosa geométrica: cê põe muita força no lápis, se eu tivesse seu tempo, ninguém na escola me passava, inteligência não é estudar, por exemplo falar você em vez de cê, é tão mais bonito, é só acostumar. Quando o coração da gente dispara e a gente fala cortado, era desse jeito que tava a voz da mãe.
Achava estudo a coisa mais fina e inteligente era mesmo, demais até, pensava com a maior rapidez. Gostava de ler de noite, em voz alta, com tia Santa, os livros da Pia Biblioteca, e de um não esqueci, pois ela insistia com gosto no titulo dele, em latim: Máguina pecatrís. Falava era antusiasmo e nunca tive coragem de corrigir, porque toda vez que tava muito alegre, feito naquela hora, desenhando, feito no dia de noite, o pai fazendo serão, ela falou: coitado, até essa hora no serviço pesado.
Não estava gostando nem um pouquinho do desenho, mas nem que eu falava. Com tanta satisfação ela passava o lápis, que eu fiquei foi aflita, como sempre que uma coisa boa acontecia.Bom também era ver ela passando creme Marsílea no rosto e Antissardina n° 3, se sacudindo de rir depois, com a cara toda empolada. Sua mãe é bonita, me falaram na escola. E era mesmo, o olho meio verde.
Tinha um vestido de seda branco e preto e um mantô cinzentado que ela gostava demais.Dia ruim foi quando o pai entestou de dar um par de sapato pra ela. Foi três vezes na loja e ela botando defeito, achando o modelo jeca, a cor regalada, achando aquilo uma desgraça e que o pai tinha era umas bobagens. Foi até ele enfezar e arrebentar com o trem, de tanta raiva e mágoa.
Mas sapato é sapato, pior foi com o crucifixo. O pai, voltando de cumprir promessa em Congonhas do Campo, trouxe de presente pra ela um crucifixo torneadinho, o cordão de pendurar, com bambolim nas pontas, a maior gracinha. Ela desembrulhou e falou assim: bonito, mas eu preferia mais se fosse uma cruz simples, sem enfeite nenhum.
Morreu sem fazer trinta e cinco anos, da morte mais agoniada, encomendando com a maior coragem: a oração dos agonizantes, reza aí pra mim, gente.
Fiquei hipnotizada, olhando a mãe. Já no caixão, tinha a cara severa de quem sente dor forte, igualzinho no dia que o João Antônio nasceu. Entrei no quarto querendo festejar e falei sem graça: a cara da senhora, parece que tá com raiva, mãe.
O Senhor te abençoe e te guarde,
Volva a ti o Seu Rosto e se compadeça de ti,
O Senhor te dê a Paz.
Esta é a bênção de São Francisco, que foi abrandando o rosto dela, descansando, descansando, até como ficou, quase entusiasmado.
Era raiva não. Era marca de dor.


(Extraído de Prosa Reunida, Editora Siciliano - São Paulo, 1999, e incluído por Ítalo Moriconi no livro Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século, Editora Objetiva - Rio de Janeiro, 2000, pág. 349)


Postado por Literatura sem fronteiras – niltomaciel@uol.com.br

Conto: Famigerado

Guimarães Rosa

Foi de incerta feita — o evento. Quem pode esperar coisa tão sem pés nem cabeça? Eu estava em casa, o arraial sendo de todo tranqüilo. Parou-me à porta o tropel. Cheguei à janela.Um grupo de cavaleiros. Isto é, vendo melhor: um cavaleiro rente, frente à minha porta, equiparado, exato; e, embolados, de banda, três homens a cavalo. Tudo, num relance, insolitíssimo. Tomei-me nos nervos. O cavaleiro esse — o oh-homem-oh — com cara de nenhum amigo. Sei o que é influência de fisionomia. Saíra e viera, aquele homem, para morrer em guerra. Saudou-me seco, curto pesadamente. Seu cavalo era alto, um alazão; bem arreado, ferrado, suado. E concebi grande dúvida.
Nenhum se apeava. Os outros, tristes três, mal me haviam olhado, nem olhassem para nada. Semelhavam a gente receosa, tropa desbaratada, sopitados, constrangidos coagidos, sim. Isso por isso, que o cavaleiro solerte tinha o ar de regê-los: a meio-gesto, desprezivo, intimara-os de pegarem o lugar onde agora se encostavam. Dado que a frente da minha casa reentrava, metros, da linha da rua, e dos dois lados avançava a cerca, formava-se ali um encantoável, espécie de resguardo. Valendo-se do que, o homem obrigara os outros ao ponto donde seriam menos vistos, enquanto barrava-lhes qualquer fuga; sem contar que, unidos assim, os cavalos se apertando, não dispunham de rápida mobilidade. Tudo enxergara, tomando ganho da topografia. Os três seriam seus prisioneiros, não seus sequazes. Aquele homem, para proceder da forma, só podia ser um brabo sertanejo, jagunço até na escuma do bofe. Senti que não me ficava útil dar cara amena, mostras de temeroso. Eu não tinha arma ao alcance. Tivesse, também, não adiantava. Com um pingo no i, ele me dissolvia. O medo é a extrema ignorância em momento muito agudo. O medo O. O medo me miava. Convidei-o a desmontar, a entrar.
Disse de não, conquanto os costumes. Conservava-se de chapéu. Via-se que passara a descansar na sela — decerto relaxava o corpo para dar-se mais à ingente tarefa de pensar. Perguntei: respondeu-me que não estava doente, nem vindo à receita ou consulta. Sua voz se espaçava, querendo-se calma; a fala de gente de mais longe, talvez são-franciscano. Sei desse tipo de valentão que nada alardeia, sem farroma. Mas avessado, estranhão, perverso brusco, podendo desfechar com algo, de repente, por um és-não-és. Muito de macio, mentalmente, comecei a me organizar. Ele falou:
"Eu vim preguntar a vosmecê uma opinião sua explicada..."
Carregara a celha. Causava outra inquietude, sua farrusca, a catadura de canibal. Desfranziu-se, porém, quase que sorriu. Daí, desceu do cavalo; maneiro, imprevisto. Se por se cumprir do maior valor de melhores modos; por esperteza? Reteve no pulso a ponta do cabresto, o alazão era para paz. O chapéu sempre na cabeça. Um alarve. Mais os ínvios olhos. E ele era para muito. Seria de ver-se: estava em armas — e de armas alimpadas. Dava para se sentir o peso da de fogo, no cinturão, que usado baixo, para ela estar-se já ao nível justo, ademão, tanto que ele se persistia de braço direito pendido, pronto meneável. Sendo a sela, de notar-se, uma jereba papuda urucuiana, pouco de se achar, na região, pelo menos de tão boa feitura. Tudo de gente brava. Aquele propunha sangue, em suas tenções. Pequeno, mas duro, grossudo, todo em tronco de árvore. Sua máxima violência podia ser para cada momento. Tivesse aceitado de entrar e um café, calmava-me. Assim, porém, banda de fora, sem a-graças de hóspede nem surdez de paredes, tinha para um se inquietar, sem medida e sem certeza.
— "Vosmecê é que não me conhece. Damázio, dos Siqueiras... Estou vindo da Serra..."
Sobressalto. Damázio, quem dele não ouvira? O feroz de estórias de léguas, com dezenas de carregadas mortes, homem perigosíssimo. Constando também, se verdade, que de para uns anos ele se serenara — evitava o de evitar. Fie-se, porém, quem, em tais tréguas de pantera? Ali, antenasal, de mim a palmo! Continuava:
— "Saiba vosmecê que, na Serra, por o ultimamente, se compareceu um moço do Governo, rapaz meio estrondoso... Saiba que estou com ele à revelia... Cá eu não quero questão com o Governo, não estou em saúde nem idade... O rapaz, muitos acham que ele é de seu tanto esmiolado..."
Com arranco, calou-se. Como arrependido de ter começado assim, de evidente. Contra que aí estava com o fígado em más margens; pensava, pensava. Cabismeditado. Do que, se resolveu. Levantou as feições. Se é que se riu: aquela crueldade de dentes. Encarar, não me encarava, só se fito à meia esguelha. Latejava-lhe um orgulho indeciso. Redigiu seu monologar.O que frouxo falava: de outras, diversas pessoas e coisas, da Serra, do São Ão, travados assuntos, inseqüentes, como dificultação. A conversa era para teias de aranha. Eu tinha de entender-lhe as mínimas entonações, seguir seus propósitos e silêncios. Assim no fechar-se com o jogo, sonso, no me iludir, ele enigmava: E, pá:
— "Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmisgerado... faz-megerado... falmisgeraldo... familhas-gerado...?
Disse, de golpe, trazia entre dentes aquela frase. Soara com riso seco. Mas, o gesto, que se seguiu, imperava-se de toda a rudez primitiva, de sua presença dilatada. Detinha minha resposta, não queria que eu a desse de imediato. E já aí outro susto vertiginoso suspendia-me: alguém podia ter feito intriga, invencionice de atribuir-me a palavra de ofensa àquele homem; que muito, pois, que aqui ele se famanasse, vindo para exigir-me, rosto a rosto, o fatal, a vexatória satisfação?
— "Saiba vosmecê que saí ind'hoje da Serra, que vim, sem parar, essas seis léguas, expresso direto pra mor de lhe preguntar a pregunta, pelo claro..."
Se sério, se era. Transiu-se-me.
— "Lá, e por estes meios de caminho, tem nenhum ninguém ciente, nem têm o legítimo — o livro que aprende as palavras... É gente pra informação torta, por se fingirem de menos ignorâncias... Só se o padre, no São Ão, capaz, mas com padres não me dou: eles logo engambelam... A bem. Agora, se me faz mercê, vosmecê me fale, no pau da peroba, no aperfeiçoado: o que é que é, o que já lhe perguntei?"
Se simples. Se digo. Transfoi-se-me. Esses trizes:
— Famigerado?
— "Sim senhor..." — e, alto, repetiu, vezes, o termo, enfim nos vermelhões da raiva, sua voz fora de foco. E já me olhava, interpelador, intimativo — apertava-me. Tinha eu que descobrir a cara. — Famigerado? Habitei preâmbulos. Bem que eu me carecia noutro ínterim, em indúcias. Como por socorro, espiei os três outros, em seus cavalos, intugidos até então, mumumudos. Mas, Damázio:
— "Vosmecê declare. Estes aí são de nada não. São da Serra. Só vieram comigo, pra testemunho..."Só tinha de desentalar-me. O homem queria estrito o caroço: o verivérbio.
— Famigerado é inóxio, é "célebre", "notório", "notável"...
— "Vosmecê mal não veja em minha grossaria no não entender. Mais me diga: é desaforado? É caçoável? É de arrenegar? Farsância? Nome de ofensa?"
— Vilta nenhuma, nenhum doesto. São expressões neutras, de outros usos...
— "Pois... e o que é que é, em fala de pobre, linguagem de em dia-de-semana?"
— Famigerado? Bem. É: "importante", que merece louvor, respeito...
— "Vosmecê agarante, pra a paz das mães, mão na Escritura?"
Se certo! Era para se empenhar a barba. Do que o diabo, então eu sincero disse:
— Olhe: eu, como o sr. me vê, com vantagens, hum, o que eu queria uma hora destas era ser famigerado — bem famigerado, o mais que pudesse!...
— "Ah, bem!..." — soltou, exultante.
Saltando na sela, ele se levantou de molas. Subiu em si, desagravava-se, num desafogaréu. Sorriu-se, outro. Satisfez aqueles três: — "Vocês podem ir, compadres. Vocês escutaram bem a boa descrição..." — e eles prestes se partiram. Só aí se chegou, beirando-me a janela, aceitava um copo d'água. Disse: — "Não há como que as grandezas machas duma pessoa instruída!" Seja que de novo, por um mero, se torvava? Disse: — "Sei lá, às vezes o melhor mesmo, pra esse moço do Governo, era ir-se embora, sei não..." Mas mais sorriu, apagara-se-lhe a inquietação. Disse: — "A gente tem cada cisma de dúvida boba, dessas desconfianças... Só pra azedar a mandioca..." Agradeceu, quis me apertar a mão. Outra vez, aceitaria de entrar em minha casa. Oh, pois. Esporou, foi-se, o alazão, não pensava no que o trouxera, tese para alto rir, e mais, o famoso assunto.


(Extraído do livro Primeiras Estórias, Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1988, pág. 13.)


Postado por Literatura sem fronteiras – niltomaciel@uol.com.br

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Paráfrase


O teatro, não é apenas um veículo da peça, a serviço do autor e da literatura. É uma arte distinta, em sua função a peça é escrita. O teatro não está a serviço da peça, esta é que é material dele, sendo um dos elementos que o compõem. Assim o teatro não é literatura
nem um meio de propagá-la. O texto, a peça, seriam literatura se fossem apenas declamados. A partir do momento em que são representados, transformam-se em teatro, e seus declamadores, ao incorporar personagens, tornam-se atores. A essência do teatro é a junção, a identificação que ocorre entre o ator e a personagem- fato que marca a passagem de uma arte temporal e auditiva (a literatura) ao comando de uma arte audiovisual ou espaço temporal. O valor das palavras modifica-se radicalmente. No teatro são os atores/personagens que regem a palavra. Na literatura a palavra inspira o homem. No teatro o homem inspira a palavra.

Circuito fechado


O Chuveiro, a água, o xampu, a espuma, a água, o condicionador, a água.
O sabonete, a espuma, a água. A toalha macia, o hidratante de pêssego.
O creme facial, o pente, o creme leave-in, a presilha, o espelho.
O vestido, o batom, o lápis o rímel, a sombra, o blush, o espelho.
A sandália, a bolsa, o carro, o espelho.
O namorado. O ingresso. O cinema.
As cadeiras de trás. O filme.
A escuridão. A pipoca.
Os olhares. A cena de ação.
As mãos. A pipoca. As crianças barulhentas, os pedidos de silêncio.
A tela. O suspense.
O refrigerante. Os afagos.
O filme. Os beijos
Os beijos.
Os beijos.
O fim do filme.
A saída do cinema.
A moça, o namorado, os abraços.
O carro.


Sobre a fragmentação

A linguagem fragmentada aparece claramente nos textos e filmes que assistimos. Eles não se prendem em um único assunto, mas o abordam de forma rápida, e, às vezes até incompleta.
A propaganda do banco real e o filme ilha das flores são estruturados de forma muito parecida. Apesar de não darem continuidade a um tema, eles estabelecem claramente uma interdependência entre os assuntos, de forma que um sempre faz menção a outro; Na propaganda, falam brevemente de Yuri, mas o retomam várias vezes, mostrando o elo existente entre ele e as demais situações. Em ilha das flores, o mesmo acontece com o tomate, que é citado em momentos distintos.
O texto quadrilha, também estabelece uma relação entre os fatos. Porém, ao contrário dos dois vídeos os assuntos obedecem a uma sequência.
Por fim, analisando os textos Circuito fechado, e A pesca percebe-se que são constituídos apenas de frases nominais. No entanto, têm caráter narrativo e possuem cronologia bem definida.

domingo, 13 de setembro de 2009

O que quero





Brisa de verão, dias felizes, tarde ensolarada.
Lugar tranquilo, refúgio. Jabuticaba. Piquenique. Torta de limão.
Pessoas cantando uma canção. Alguém dedilhando um violão.
Sarau, vaga-lumes noite estrelada. Você.

Belas manhãs, céu de brigadeiro, cachoeira, sol.
Doce de leite, fogão à lenha, queijo com goiabada. Cavalgar pelas campinas, ouvir o canto dos pássaros, descansar na relva.
Verdejantes colinas, borboletas coloridas, riacho. Você.

Tomar banho de chuva. Acampar. Viajar pro Sul:
Aquecer-me ao redor de uma lareira, tomando chocolate quente.
Brindar a vida com um vinho antigo. Ouvir músicas do Roupa Nova.
Brisa leve. Cheiro de terra molhada. Bons livros. Você.

Quintal grande, pessoas felizes, casa na árvore.
Crianças brincando, pomar, fruta no pé.
Apreciar a primavera. Ver campos floridos. Orvalho nas plantas.
Tarde que se finda, entardecer dourado, rede na varanda.

Paz de espírito, consciência tranquila, Deus.
Ser feliz por completo, viver intensamente cada momento.
Amar a vida, com suas surpresas e imprevisões.
Rechear de alegria minha existência, com a força arrebatadora de um grande amor.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

O ano em que meus pais saíram de casa.



A história se passa em 1970, ano de copa do mundo. Os brasileiros estavam ansiosos e entusiasmados. Entre eles Mauro, um garoto de doze anos, que como a maioria dos brasileiros, era apaixonado por futebol. Contudo esse contexto de alegria que tomava conta do Brasil, estava mesclado ao sentimento de medo e inquietude que assolava a nação. Era época de ditadura militar. Muitas pessoas eram perseguidas, torturadas, exiladas e até mortas, em razão de terem, de alguma forma, expressado opiniões contrárias à arbitrariedade dos chefes de Estado. Os pais de Mauro se encontravam nessa situação. Tiveram que fugir para não sofrerem as cruéis punições a que eram submetidas às pessoas que manifestavam alguma objeção contra o governo. Para pouparem o filho, disseram que iriam tirar férias e o deixaram na cidade do avô.
A vida de Mauro começa a passar então por muitas transformações. Seu avô havia morrido e ele precisou morar com um judeu que conhecera acidentalmente. Naquela nova cidade, ele fez amizades, conviveu com pessoas e culturas diferentes, sentiu muita saudade de seus pais, que prometeram voltar na copa. Coisa, aliás, que para a tristeza de Mauro, não aconteceu.

Preocupado com o destino dos pais, o menino não mais se entusiasmava com as vitórias do Brasil, e esperava ansioso, ao lado do telefone, alguma notícia deles. O medo de nunca mais vê-los, se agravou quando pessoas da vila começaram a ser presas.

Depois do término da copa, a mãe de Mauro retorna sozinha. Eles voltam pra casa e recomeçam suas vidas. O Brasil vence a copa, enchendo de orgulho os brasileiros. A ditadura, porém continua ainda por bastante tempo, maculando assim uma parte da nossa história. Parte essa, aliás, da qual não nos orgulhamos nenhum pouco.